A ÁRVORE DA POESIA (conto)
Para o Espaço Pasárgada, do Recife
Manuel plantou a amendoeira na beira do rio com as suas mãos de criança. Todos os dias saía da Rua da União e ia vê-la crescer. A sua primeira contemplação era ela. Depois as brincadeiras.
Os meses se passaram e vieram uns homens da Prefeitura com desenhos, papéis indecifráveis, aparelhos estrangeiros, uma máquina com um tripé que não era um lambe-lambe, e começou a surgir, e surgiu, a ponte. Do outro lado, o Teatro Santa Isabel aguardava os que faziam a travessia da Rua da Aurora.
A amendoeira cresceu e ficou maior do que o casarão da esquina da Rua da Aurora com a Princesa Isabel. Derrubaram o casarão, ergueram um edifício azul, para instalação da Secretaria de Segurança Pública da cidade, e a amendoeira continuou crescendo e ficou do mesmo tamanho do edifício azul.
Manuel já vivia outras aventuras mas sem esquecer a sua amendoeira. E um dia resolveu se mudar para o Rio de Janeiro. Para os seus sonhos o Rio de Janeiro seria um lugar melhor do que o Recife. E de lá seguiria mais facilmente para outras cidades do mundo que desejava conhecer : Paris, Lisboa, Madrid, Londres, Genebra, Roma, Veneza, Shangrilah, Pasárgada...
Manuel foi se despedir da amendoeira. Acariciou suas grossas raízes, misturou-se meio extasiado a sua folhagem generosa, quase caindo no rio, se deixou ficar junto ao seu tronco robusto, voltou-se inteiro para ele e, não teve dúvida, penetrou-o como quem atravessa uma porta aberta, um corpo não-físico, a alma da árvore.
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Disseram depois, os seus parentes, que Manuel viajou ao Rio de Janeiro. Estava lá. Isto era o que sabiam os seus amigos e conhecidos também, todos os moradores da Rua da União, e as famílias, os Bandeira, os Mello...
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Manuel nunca saiu do Recife. E cresceu com a sua árvore : densa, frondosa, um verde exuberante e sempre jovem, em contraste com a cidade e a própria Rua da Aurora, que morre no seu cinzento e na desconstrução dos seus casarões, e com o Rio Capibaribe, um morto carregando uma história de vivo, como se fosse perene e eterno feito a árvore de Manuel.
JUAREIZ CORREYA
(Recife, quarta-feira de cinzas,
fevereiro / 2009 )
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